No dia 30 de julho de 2024, a Data Privacy Brasil organizou o evento “Horizontes Comuns: o papel da infraestrutura pública digital em finanças, identidade e justiça climática”, na sede da Dataprev, em Brasília. O evento marcou o lançamento do relatório “A infraestrutura da identidade: os influxos de uma identidade digital como aplicação da IPD”, de autoria dos pesquisadores Eduarda Almeida e Pedro Bastos Lobo Martins, da Data Privacy Brasil.

No painel “Infraestruturas públicas digitais em ação: análises setoriais”, realizada na manhã do dia 30, quatro especialistas foram convidados para debater problemas setoriais de IPDs: Otávio Neves (Controladoria Geral da União), Jameson Voisin (Digital Public Goods Alliance), Maria Luciano (Idec), Marcel Kremnitzer (Banco Central do Brasil). A mediação foi de Louise Karczeski da Data Privacy Brasil.

No painel, Otávio Neves (CGU) discutiu os desafios de mudança de cultura sobre dados pessoais no setor público, ainda visto como “uma questão de T.I.”. A falta de conceitos compartilhados sobre governança de dados gera dúvidas e problemas no momento de tomada de decisão por servidores públicos no Brasil. “O trabalho que a gente tem feito é levar essa reflexão para dentro da administração, promover a capacitação desses atores, que eles passem a ter um olhar mais estratégico sobre a questão dos dados, o que tem impacto direto na infraestrutura pública digital”, sustentou Otávio.

Para Neves, a governança de dados tende a ser participativa e em múltiplos níveis: no momento de coleta, de tratamento, de decisão sobre usos secundários ou descarte. “Há diversas possibilidades de utilização de dados e temos que fazer essa reflexão com múltiplos atores dentro de uma mesma estratégia”, argumentou.

Em sua palestra, Jameson Voisin (DPGA) introduziu os efeitos da aliança para promoção de softwares de código aberto para promoção de “bens públicos” no ambiente digital. Jameson defendeu maior sinergias entre IPDs e “bens públicos digitais”. Por tal conceito, pode-se entender um conjunto de padrões, protocolos e softwares abertos que são construídos com valores como privacidade e não maleficência (do no harm). A DPGA defende a customização e territorialização dos bens públicos digitais em diferentes contextos.

Segundo Voisin, tais padrões, protocolos e softwares abertos fazem parte do conjunto de elementos que formam as infraestruturas públicas digitais. “Elas permitem também maior colaboração entre países, como nos casos de Singapura e Camboja”, afirmou Voisin.

Maria Luciano (Idec) analisou a problemática das infraestruturas públicas digitais pelo ponto de visto dos consumidores e da vulnerabilidade. “Um primeiro nível de risco é o de segurança da informação”, lembrou Maria Luciano. Além deste, a pesquisadora explorou as dificuldades de manutenção do interesse público. “Projetos de IPD podem também gerar concentração de mercados”. Luciano também discutiu o risco de ausência de participação, dando exemplos de Quênia. Por fim, sistema de IPD podem produzir riscos de exclusão, como nos casos de identificação obrigatória para pessoas trans ou para acesso a medicamentos, segundo Maria Luciano.

“O que significa impor que uma conta no Gov.br seja criada pelo cidadão para se fazer uma reclamação no Procon?”, questionou Maria Luciano. “Quais os riscos de você desatender uma pessoa justamente em razão da digitalização?”.

Marcel Kremnitzer (Banco Central do Brasil) abordou a experiência do Pix como exemplar de uma IPD. No Brasil, a maioria das transações por Pix são abaixo de R$ 200,00, gerando ganhos qualitativos de segurança pública pelo fato de as pessoas não carregarem dinheiro em espécie. “A inclusão financeira hoje precisa ser de qualidade. O cidadão precisa abrir uma conta de forma condizente com sua condição financeira. Não pode superenvididá-lo e precisa ser útil”, fiz Marcel.

Segundo estimativas do Banco Central do Brasil, o Pix incluiu 70 milhões de pessoas em uma dimensão financeira. Os pequenos negócios hoje no Brasil são dependentes de celulares e do sistema Pix. “O Pix automático, que será lançado em outubro, vai democratizar o planejamento financeiro dos cidadãos”, afirmou Marcel.

Para Marcel, o Open Finance tem uma diferença grande em comparação com o Pix. A governança e gestão do Open Finance é feito pelo mercado. As regras são determinadas pelo Banco Central, bem como o monitoramento de qualidade. “O Open Finance visa empoderar o consumidor para obter benefícios com seus dados. Os dados pertencem a eles e eles devem utilizar de maneira a melhorar a condição e a vida financeira deles”, sustentou Kremnitzer. “Mais de 30 milhões de brasileiros já deram consentimento para o Open Finance”, concluiu.

O Drex é um projeto piloto do Banco Central. Ele é uma “extensão digital do papel moeda”, tornando-se uma infraestrutura em ledger distribuído (DLT). Sob essa infraestrutura, diversos atores (academia, mercado, entidades privadas) podem construir casos de uso que são inovadores. “O Drex está sendo construído para habilitar usos que não existem hoje. Está em teste piloto com 16 consórcios e mais de 60 empresas e cooperativas”, disse Marcel, apontando para o futuro das IPDs no sistema financeiro brasileiro.

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